Buscando opiniões e experiências diferentes da minha, perguntei para minha amiga Camila Guido, que já viajou bastante de mochilão e de bike, como ela se vira com hospedagem? Confira!
Resposta: Ao contrário do que se possa imaginar, nem sempre é fácil encontrar um teto para chamar de seu quando se está viajando de bicicleta. Infelizmente, não são todos os hotéis, pousadas e afins que possuem um lugar para guardar a bike (estacionamento, garagem, um quartinho que serve como depósito e que não é muito utilizado etc.). Há estabelecimentos onde se dá um jeito, ou seja, a bici fica guardada num corredor, num cantinho do saguão, num espaço sob escadarias, nas próprias escadarias (sim, já aconteceu comigo) ou, na pior das hipóteses, ela vai com você para o quarto (particularmente, detesto essa opção, já que, normalmente, a bike não está lá muito limpinha para dividir o quarto com ninguém), mas essa não é necessariamente a regra.
Acampar pode ser uma ótima opção, já que bike e barraca são reconhecidamente uma boa dupla; porém, para tanto, você terá que carregar equipamento de camping (barraca, saco de dormir etc.), o que nem sempre é viável ou desejável. Digo viável pois em viagens onde a altimetria é hardcore o peso e o volume da tralha de camping podem atrapalhar bastante o pedal; quando, por exemplo, o roteiro exige que você “escale” três subidas fortes e longas por dia, poder pedalar com o mínimo de peso possível é a melhor opção, principalmente se você não é tão forte ou não está tão condicionado. Além disso, para quem nunca teve o “Manual do escoteiro-mirim” como livro de cabeceira, acampar pode não ser o tipo de acomodação mais indicada, especialmente depois de um dia duro de pedal. Particularmente, eu gosto bastante de acampar e não penso duas vezes quando essa é a única opção disponível ou aquela que, em função do aspecto econômico, possibilita a realização da viagem. Mas, confesso: adoro um bom hotel, pousada, hostel etc.
A questão da aceitação e da acomodação da bike pelo estabelecimento invariavelmente dependerá, como já mencionado acima, de espaço e de boa vontade. Se a sua cicloviagem é fundamentalmente uma trip rural, você provavelmente não enfrentará problemas, já que as propriedades ao longo do caminho certamente terão espaço de sobra para a sua bicicletinha; porém, nas cidades, especialmente nas grandes, o caldo pode entornar.
A minha recomendação é sempre ter algumas cartas na manga; mesmo que você não esteja disposto a fazer reservas e, portanto, a engessar um pouco a viagem, procure pesquisar, com antecedência, quais são os estabelecimentos que aceitam bicicletas nas cidades pelas quais você passará e nas quais há chance de pernoitar. Guias de cicloviagens, como os de Antonio Olinto e Rafaela Asprino e os de Guilherme Cavallari trazem dicas de hospedagem; os famosos guias da Lonely Planet (imbatíveis e de longe os meus preferidos), na sua versão Cycling Guides, elencam diversas opções de acomodação para viajantes em bicicleta; dependendo da região e do país, sites especializados também podem ser boas fontes de indicação de hospedagem.
Outra opção é simplesmente enviar um e-mail ou ligar para o estabelecimento escolhido e perguntar sobre a bici; no caso de sites como o Booking.com (o meu preferido para efetuar reservas em hotéis, pousadas e até em hostels), é possível visualizar, na página do estabelecimento escolhido, se ele possui estacionamento privativo.
O segredo, para evitar perrengues, é basicamente não negligenciar o elemento bicicleta no planejamento da hospedagem; eu já passei por situações bem exasperantes e acabei tendo que desembolsar uma grana que não estava no roteiro para poder colocar a minha bike para dormir num lugar seguro e tranquilo e, acredite, foi um pouco frustrante.
Vale apontar: alta temporada e grandes cidades europeias com centros espremidos, como Florença, são indicadores de atenção. Pesquise antes e, se possível, reserve, caso não queira gastar os tufos para acomodar sua bicicleta.
Uma possibilidade bem legal, especialmente se você estiver viajando sozinho, são as redes sociais de troca de hospedagem, como o Couchsurfing, o Hospitality Club e o WarmShowers, sendo o último uma rede específica para cicloviajantes. Aqui costumo ouvir a pergunta: mas é seguro? Sim, costuma ser. Nunca ouvi nenhum relato que desabonasse qualquer uma dessas redes e nunca tive uma experiência “perigosa”. Claro que eventualmente você pode se decepcionar um pouco com seu anfitrião ou hóspede, mas as coisas ficam no nível da falta de empatia ou da estranheza relativa a hábitos pessoais. De resto, costuma ser uma experiência bastante rica e altamente recomendável. Tendo a sorte de descolar um anfitrião legal, você certamente vai descobrir muito mais sobre o local onde está do que jamais imaginou e terá uma visão menos turística daquilo que está vendo. Isso sem falar que é free! (Lembrando que não custa pensar num presentinho para o seu anfitrião, mesmo que simbólico, para agradecer a generosidade. Gentileza nunca é demais!) No caso dessas redes, ao entrar em contato para perguntar sobre a possibilidade de hospedagem, não esqueça de mencionar a bike.
Ufa, cansou? Calma porque a viagem ainda nem saiu da tela. E não se iluda: mesmo com todas essas dicas e com todo o planejamento, várias coisinhas sairão fora do roteiro. Não fosse assim, que graça teria? Se viajar é, numa certa medida, a oportunidade de viver outra vida dentro da nossa própria, eu não acredito que você gostaria de nascer, crescer e morrer sabendo tudo o que vai rolar pelo caminho. Como eu costumo dizer, planeje, mas saiba que o universo costuma ser bem generoso com os viajantes de mente e coração abertos. Que venham as (boas) surpresas!
Camila Guido Vignando é servidora pública federal, autora do blog “Pensamentos Inadequados” e viciada em viagens. Vem mochilando e pedalando por aí, sempre que possível, há alguns anos, e já levou sua bike para alguns passeios, pelo Brasil e fora dele. Também é praticante de Iyengar Yoga e coautora do mini curso “Yoga no Cicloturismo”.